domingo, 10 de agosto de 2014

HERIBERTO PORTO | Cartas musicais dentro e fora do baralho



FM De que maneira a música começa a fazer parte de tua vida?

HP Desde cedo fui cativado pelos sons, apesar de não pertencer a uma família de músicos. Nasci em 1964 e morei toda a infância em Aracati, no interior do Ceará, quase na beira do Rio Jaguaribe, em uma casa grande cheia de tamarineiras no quintal. Lembro que por volta dos 7 anos ouvi na televisão, um minúsculo preto e branco que só transmitia a Tupi e a TV Ceará, o “Brasileirinho” com Waldir Azevedo, e essa música me deixou fascinado, fiquei parado um tempão a escutando. Eletricidade pura. Aí aconteceram várias coisas: achei uma escaleta que meus irmãos tinham ganhado de meu pai e comecei a soprar. Saía um som bem definido e também um monte de formigas que sempre continuaram a morar lá. Tenho gravada até hoje na memória a altura das notas deste instrumento. Daí a importância de se começar cedo a música para a aquisição do chamado “ouvido absoluto”, que nada mais é do que a capacidade de identificar os sons, de lembrar deles. A minha casa era meio rota para uns mochileiros hippies que queriam chegar ao Cumbe, um lugar meio pré-Canoa Quebrada. Um deles deixou de lembrança uma flauta doce. Um dia um vizinho chegou na casa ao lado, era um militar da marinha e ficava tocando trompete, eu pegava a escaleta e através da parede tentava um diálogo com ele. Depois comecei, já em Fortaleza, umas aulas de flauta doce no colégio. Eu tinha 13 anos. Na época participei da Fundação de uma Orquestra da Catedral, na época do Cardeal Lorscheider. Era a orquestra Fratelli fundada pelo Frei Wilson.
Muita gente começou música por lá. Daí para a flauta transversal foi um pulo. Na Orquestra estudei uns três anos violino, mas quando cheguei na Bélgica, em 1983, tive de parar, pois tinha de dar conta de muito estudo e dois instrumentos era demais.

FM Temos aí uma admirável série de fatos interligados, a magia de notas (dados) que iam sendo tocadas por um acaso objetivo, preparando e definindo o teu ouvido absoluto. Agora, além de “Brasileirinho”, recordas alguma outra música marcante neste primeiro momento, até a tua entrada na Orquestra da Catedral?

HP Quando eu tinha doze anos morreu meu pai, também Heriberto, e foi aí que meus irmãos mais velhos Rui e Márcio vieram embora de Brasília, onde moravam. Trouxeram com eles discos que para mim serviram como uma verdadeira formação musical: Chico Buarque, Milton Nascimento — “Olhos nos Olhos”, “Mulheres de Atenas”, “Milagre dos Peixes”…-, tinha também o rock dos setenta, o progressivo, Gênesis, Jethro Tull, Focus. Além dos discos, vieram livros: Maiakovski, Kafka, Rilke, Neruda e Lorca, juntamente com os jornais subversivos Cidade Livre, Le Monde, tudo aquilo era o despertar para um outro mundo além deste do rio, dos bichos e pescarias. Época de ditadura, me sentia importante com estes livros, apesar de não entendê-los muito bem. Também a partir dos 15 anos comecei a ouvir Miles Davis, Weather Report, John McLaughlin, a turma do jazz- rock que fazia sucesso na época.

FM O que exatamente propiciou a ida para Bruxelas?

HP Foi o trabalho com a Orquestra Fratelli. Como eu era o sub-regente da Orquestra, na pessoa do Frei Wilson, quis buscar uma bolsa de estudos para eu poder fazer meus estudos. Na Bélgica morava Frei Hermínio Bezerra (hoje no Vaticano), que fazia doutorado e serviu de contato para eu poder ir. Com 18 anos fui encontrar lá uma família que me acolheu como um filho, virei “le troisiémme” da família Caspar em La Hulpe, uma cidade de 8.000 habitantes na beira da floresta com castelos e uma igreja de 1230.

FM Na Bélgica intensificas o estudo de música erudita, passas a ter contato com o jazz, e inclusive chegas a fundar um grupo, Cheiro de Choro, mais especificamente dedicado à música brasileira. Cultivavas desde então uma completa ausência de fronteiras, aqueles limites clássicos entre o erudito, o popular, o contemporâneo. A que atribuis esta postura tão livre?

HP Acho que foi devido a essa primeira formação, às coisas que eu gostava de ouvir. No Conservatório de Bruxelas tive de dar duro para enfrentar os primeiros concursos então passei uns quatro anos só tocando música escrita, antiga e moderna, as coisas do repertório de flauta, muitos franceses, Fauré, Jolivet, Gaubert, Honneger etc. Depois do primeiro diploma (primeiro prêmio de flauta) foi que reencontrei o amigo Henri Greindl, músico belga que havia regressado da Califórnia. Assim surgiu o Cheiro de Choro. Na época não conhecia muita música brasileira. O grupo foi uma escola. Aí tive contato com o choro, o baião, a improvisação. Até hoje o grupo resiste e gravou outros CDs, além do primeiro que eu fiz com eles. Atribuo esse ecletismo a uma busca pessoal por linguagens diferentes, ao lado da necessidade de se conseguir mais trabalho. Com a música brasileira eu podia trabalhar mais, me destacar na Bélgica. Fui estudar improvisação livre primeiro, tentando quebrar mais radicalmente com certos paradigmas do erudito, conheci o maravilhoso Fabrizio Cassol (do trio Aka Moon), depois fiz o Conservatório de Bruxelas, na secção Jazz, com Steve Houben. Enfim, no começo achava que eu tinha de me definir: sou um músico clássico ou popular? Depois vi que esta indefinição poderia ser uma forma, uma maneira, algo difícil, porém muito boa. Tocar de tudo um pouco, ou muito, provar das linguagens, assumir os personagens, como um ator que consegue representar Molière e Pirandello. Hoje imagino como misturar tudo isso num só trabalho: a música antiga com improvisações e elementos brasileiros.

FM Isto seria magnífico. Há neste sentido um bom caminho preparado pelo Hermeto, e ampliado por alguns de seus músicos, a exemplo do Jovino dos Santos e o Itiberê Zwarg. Mas aí o plano não envolve propriamente o que chamas de música antiga, e sim uma mescla de elementos brasileiros em ambiente jazzístico. Agora, eu preciso ainda que me contes o desdobramento deste largo período na Bélgica e o que exatamente te levou a regressar ao Brasil, a Fortaleza.

HP Recentemente tomei conhecimento do trabalho da Orquestra Itiberê; já tinha ouvido falar, mas quando ouvi foi um susto. É uma das coisas mais interessantes que se tem feito no Brasil na música instrumental. Não só o som que é livre, aberto, mas o fato dele trabalhar com muitos jovens, é muito bonito. Eles publicaram as partituras, o que é ótimo, tornando mais próxima ainda a música deles. Depois de 12 anos na Bélgica eu tinha que me decidir: ou tentava ficar por lá ou voltava. Mas a vontade de tentar o Brasil, procurar as fontes, conhecer melhor a música foi mais forte. Não foi fácil encarar a volta, como seria o trabalho aqui, essas preocupações. Na época conheci a Maria Novais, Nazinha, minha esposa e aí foi definitivo: vou voltar e casar.

FM O ambiente encontrado aqui, no que possui de necessários vínculos entre arte e política cultural, te anima ou desencanta? O que tem sido possível concretizar aqui e, dentro das impossibilidades, quais os obstáculos reais, ou seja, a causa e não os efeitos?

HP Primeiro as conquistas. Aqui pude realizar muito, fazer coisas muito boas na música. Dar continuidade ao Grupo Syntagma foi uma delas. É uma proposta muito interessante esta dos vínculos da música nordestina com a música europeia antiga. Depois veio a Marimbanda, outro estilo, o da música instrumental, porém foi um grupo que marcou a cena musical local. O engraçado foi o susto que as pessoas levaram quando o grupo surgiu. Como é que tem um grupo assim, tão bom, no Ceará! É até um pouco o preconceito da imprensa do sul que resplandece. O bonito do grupo foi conseguir esta mescla de universos, gerações, o mestre Luizinho Duarte e toda sua vivência musical; o jovem Ítalo Almeida em seus 19 anos; o Primata, um super-talento do baixo; e eu, um pouco a cereja do bolo, na lapidação, no cuidado em fazer bem, de produzir CDs e shows.
Outra coisa boa foi entrar no corpo docente da Universidade Estadual do Ceará e poder realizar o sonho de multiplicar os conhecimentos, de repassar para os mais jovens o aprendido na escola e também na vida. Sobre as relações da arte com a política cultural, são outros quinhentos. Aqui temos algo como ciclos em que a cada quatro anos se vê uma nova equipe na administração estadual e municipal e às vezes as políticas de sucesso não têm continuidade. O projeto de uma orquestra no Ceará, por exemplo, já tem 10 anos e não foi adiante. A única existente, a orquestra de câmera Eleazar de Carvalho conseguiu se manter, à força de muito trabalho e boa gestão, mas enfrenta grandes dificuldades, principalmente orçamentárias. Tem horas em que penso: se um dia existir aqui uma boa escola, de formação básica, democrática, e uma orquestra profissional, não vai ser na minha vida, não alcançarei isto, é quase uma certeza. Mas guerra é guerra, e seguimos na luta. Hoje se reconhece a importância da cultura para um povo, um país, todos concordam que é a essência desse povo, sua riqueza e sua alma.
Ao mesmo tempo, os gastos com a cultura não chegam nem a 1%. É contraditório. Ou então quando se gasta muito é com o entretenimento, o carnaval, o reveillon, a micarêta. A Lei Federal, a Rouanet, é ótima, uma conquista, mas não quando ela dá subsídios e isenção fiscal para artistas e eventos já milionários. Eu achei bom este olhar para o interior que o Gilberto Gil cantou no início de sua gestão no Ministério e só se concretizou plenamente aqui no Ceará com a secretária Cláudia Leitão. Levar a ideia de gestão cultural para as cidades, criar mecanismos, sistematizar, criar mercados, abrir-se para um mundo gigante que é o interior do país, isto foi bom, mas teria que ter continuidade, insistência, pois o que se pode mudar é o pensamento, a perspectiva das pessoas.

FM Não adianta evocar uma ação isolada, justamente considerando sua falta de continuidade. O acerto então converte-se em outra faceta do erro, não criando perspectivas para desdobramentos, o que pode inclusive ter uma leitura de oportunismo auto-referencial da parte, por exemplo, de um secretário de cultura. Não te parece um contracenso, Heriberto, que sendo o Brasil um país essencialmente musical, a música seja tão desassistida em termos de formação para a juventude?

HP Eu acho que temos uma grande carência de escolas. Percebo que nelas se aprende muito dentro da sala de aula e muito mais nos corredores, nas cantinas; é lá que surgem os grupos, as novas ideias. Os jovens amam as artes, a música, esta sim é uma “droga” boa, mas sempre têm de ir para outros centros, outros países para estudar, desenvolver e até trabalhar. Este foi o motivo que me fez ir estudar fora e que faz com que todo ano muita gente saia do país, do estado e da cidade. No Ceará não tem uma só escola de música de formação de base para jovens. Temos os famosos “projetos” que tentam suprir isto. Hoje mesmo encontrei um jovem violinista que está postulando uma bolsa para os EUA e foi me ver na Universidade para ter alguma orientação. Às vezes se diz de um músico brasileiro: “que grande talento, um virtuose”. Mas percebo que só o talento não é tudo, falta referencial; sem orientação, o músico fica a fazer “notas rápidas”, o que é uma visão herdada do Séc. XIX. Frente a esta situação, de falta de escolas, estou indo conversar com o novo Secretário de Cultura, junto com colegas da UECE para propor algo mais consistente para nossa região.

FM Evidente que o dilema se verifica em todo o país, situação que se agrava pela própria falta de sensibilidade da parte de um ministro da cultura que sempre nos pareceu ser alguém ligado à música. O que seria este “algo mais consistente” que artistas poderiam propor à administração pública?

HP Uma coisa que acontece e que as pessoas criticam é a política de eventos, festivais, feiras, encontros. Apesar de achar que a gente tem de fugir de grandes formalismos, estruturas anacrônicas, conservatórios “importados”, consistente mesmo seria uma escola, ou escolas, é claro, que oferecessem ensino de instrumentos, de música, de composição, de criação.

FM Refletindo agora sobre o ambiente da música instrumental no Brasil, me parece que esta se encontra bem fortalecida e diversificada, com algumas apostas ousadas, bem ao contrário do ambiente da canção, que já de muito está estagnado. Vou me referir a alguns músicos e grupos, porém antes gostaria de sentir uma avaliação tua do ambiente geral.

HP Sempre tento acompanhar o movimento da música instrumental. Vejo que existe um público fiel a este estilo. As pessoas comparecem aos shows, compram discos, fora do grande mercado a música instrumental resiste. Muito da nossa música instrumental, aquela mais ligada ao Jazz, é a continuação da onda que surgiu nos anos 70, como os trios Zimbo e Tamba, muitas orquestras, tantos grupos que junto à Bossa Nova faziam um instrumental de qualidade. Era a era do “balanço”. Lembro também do Quarteto Novo, do Hermeto e Heraldo; depois veio Medusa, Pau Brasil e Cama de Gato nos '80, Antonio Adolfo, Luis Eça, Egberto Gismonti, enfim, tanta gente boa que deixa aí um exemplo de música de excelente qualidade e interesse para os novos que estão surgindo ou já surgiram há alguns anos. Há selos bem solidificados, A Maritaca, o núcleo Contemporâneo, a Acary da Luciana Rabêlo e Maurício Carrilho. Se a gente falar do choro já é um universo em si.
Só no Ceará: desde Sátiro Bilhar (um grande boêmio e violonista dos princípios do Choro), aqui tivemos um celeiro de bons instrumentistas e compositores. Terra de Humberto Teixeira, Lauro Maia, Mozart Brandão, Eleazar de Carvalho e Zé Menezes que, desde a década de '40, deram sua contribuição para a consolidação da linguagem musical brasileira. Brilharam especialmente no Choro violonistas como Francisco Soares, Nonato Luiz, Aleardo Freitas e Zivaldo Maia. Hoje, apesar da lógica de mercado privilegiar outros estilos, esta tradição musical vem sendo mantida por compositores contemporâneos que têm tornado vivo este estilo tão representativo da nossa música. Podemos citar alguns: Adelson Viana, Carlinhos Patriolino, Aroldo Araújo, Luizinho Duarte, Carlinhos Ferreira, Tarcísio Sardinha e Ítalo Almeida. Mas eles são mesmo resistentes, não têm espaços para mostrar as composições, com tão poucos grupos atuando. Quando se vai ao Rio ou Brasília, lá o choro vive hoje um verdadeiro renascimento, com grandes intérpretes tornando-se célebres e escolas de choro formando novos talentos. No entanto, se vê na maioria das produções uma supervalorização dos instrumentistas e uma repetição dos padrões do choro de antes de 1940. O choro foi um gênero que se renovou graças aos grandes autores como Radamés Gnattali, Heitor Villa-Lobos, Tom Jobim, Garoto, Hermeto Paschoal e Sivuca. Uns chamam de choro-jazz, coitados, atrás sempre dos rótulos; eu chamo de música ousada, boa. Esta é que tem de ser cultivada. Foi aí que as formações se diversificaram, se libertando do tradicional regional. Hoje temos grupos até no Japão, na França e na Bélgica, no mundo todo. O choro só se renova e pode sobreviver como um estilo atual e vivo quando recebe as boas influências do jazz, da música contemporânea, do flamenco, etc. Wagner Tiso, Leandro Braga, Guinga, Hermeto e Paulo Moura têm mostrado esta via atual do choro. Estou pensando num show só com choros contemporâneos para abril deste ano. É quando temos as comemorações do Dia do Choro, aniversário de Pixinguinha.

FM Acreditas então que não está havendo renovação do choro, apesar de sua maior presença, do surgimento de novos músicos etc.? Há todo um trabalho de composição da parte de músicos como Jovino dos Santos Neto, Henrique Cazes, Pascoal Meirelles, Carlos Malta, que me parece deve ser visto como renovação e não apenas como mera “repetição dos padrões do choro”. Não te parece?

HP Justamente. Concordo. Graças a esta turma maravilhosa, a estes nomes incríveis, o choro tem se renovado. Mas o que a gente vê muito são os velhos regionais, as imitações baratas do grupo Época de Ouro; isto acontece nos jovens que vejo pelas escolas. É uma questão difícil: o choro já é um gênero extremamente difícil, tecnicamente, uma música muito elaborada, requer muito estudo, então até se conseguir um jeito mais moderno, mais relaxado, fica mais difícil ainda. Imagine improvisar em cima do choro. É algo muito complicado. Mas é este desafio que devemos levantar. A música vocal parou, estagnou, pouca coisa nova está sendo proposta. A gente tem que pesquisar, os bons novos estão aí, mas a mídia esconde muito. Ao mesmo tempo a Internet disponibiliza uma verdadeira discoteca para quem gosta de pesquisar. Na música instrumental também acontece esta estagnação. O jovem pianista quer tocar como Chick Corea, que é referência, mas só com muita busca ele vai conseguir propor algo interessante, que seja dele. O Radamés Gnattali tinha uma maneira suingada, isto nos anos ‘50, de fazer choro, muito cromatismo, deixou uma obra vasta a ser explorada. Os arranjos que ele fazia para a Camerata Carioca, para a Orquestra de Cordas Brasileira do Henrique Cazes são obras primas. Fiquei impressionado, como todo muito, ao ouvir o Yamandú Costa, algo fora dos padrões. Ele com Paulo Moura ou Armandinho é muito bonito.

FM Como situarias dentro desta nossa conversa as composições de Ítalo Almeida ou Luizinho Duarte, a partir do que está registrado nos CDs da Marimbanda?

HP O Luizinho é o grande compositor do grupo. Ele compõe muito, sempre. As suas composições têm algo de Manuel Bandeira ou Carlos Drummond, falam bonito de coisas simples, os temas são fortes, muito samba, frevo, choro e principalmente os baiões animados que são a cara do grupo. O Ítalo é mais rebuscado, tem uma linguagem mais jazz, harmonias ricas e ousadas. Antes a gente tinha o Primata, que é um excelente compositor. No primeiro CD, hoje difícil de encontrar, tem várias músicas dele. O Aroldo Araújo, que foi baixista na Marimbanda, também é um grande compositor, pouco tocado, muito sensível e rico.

FM Dificuldades oriundas da política e do mercado não seriam bastante ampliadas pela própria indiferença da classe artística, sua ausência de responsabilidade, falta de autocrítica, etc.?

HP Existe uma falta de organização dos músicos, principalmente nesta parte do planeta. A gente vê que quando o pessoal se organiza, forma associações, elabora projetos, enfim, quando existe um trabalho conjunto a coisa tende a melhorar.
Aqui a gente não tem nem um sindicato para lutar por condições dignas para o músico. A OMB (Ordem dos Músicos do Brasil), a gente conhece de muito tempo. Não se vê ações. Neste momento estou tentando reunir os músicos profissionais daqui de Fortaleza para a gente discutir estas coisas. É muito difícil, o pessoal toca por qualquer cachê e diz que tem de ser assim, pois do contrário vai outro mais novo que faz mais barato. Existe no ar um “pra que?”, um “não vai dar certo”, que mina qualquer iniciativa positiva de se tenta mudar as coisas. O mercado se aproveita disto e explora o músico e os artistas em geral. Muita gente está rica às custas dos nossos bons e tão pouco valorizados músicos. Mas o importante é imaginar: que música boa se pode ouvir hoje? Que trabalho ainda é possível? Como é maravilhoso tocar, ouvir, amar a música. Vamos tirando as cartas da manga até elas se esgotarem.

[2007]

[Entrevista com Heriberto Porto (Brasil, 1964), publicada em Invenção do Brasil. São Paulo: Editora Descaminhos, 2013. http://www.amazon.com/Inven%C3%A7%C3%A3o-Brasil-entrevistas-Portuguese-Edition-ebook/dp/B00FTBMR24]

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